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  • Bruna Sobreira

Pela sobrevivência dos festivais.


Os festivais no Brasil já nascem na beirada do abismo. Respeitando suas especificidades um festival não é planejado em poucos meses ou obedece a uma lógica de produção imediatista, é programado, no mínimo, com um ano de antecedência e o mais importante: um festival é uma ação continuada. As políticas públicas que contemplam hoje a cultura e seus eventos estão ainda distantes de atender às demandas desse formato, tão específico e de inestimável importância para a cultura no Brasil.

Unindo a falta histórica de políticas públicas para os festivais e a atual perspectiva econômica, o resultado são vários festivais históricos, com mais de 10, 15, 20 anos de trajetória na beirada do abismo e uma profusão de primeiras edições potentes que, provavelmente, jamais ganharão uma segunda. Entre os principais problemas enfrentados hoje pelo setor encontram-se as altas tarifas tributárias, dificuldade de financiamento e manutenção e, até mesmo, embargos alfandegários.

Nessas condições, há alguns meses diversos agentes do setor começaram uma ação articulada para diálogo com a Funarte e o MINC – Ministério da Cultura por meio da Política Nacional das Artes. Depois de uma reunião em Brasília e um encontro no FILTE-Bahia o debate ganhou corpo viabilizando o I Encontro de Política de Fomento e Sustentabilidade para Festivais de Teatro realizado pela Quitanda Cultural em Fortaleza, na última semana. Na ocasião, reuniram-se representantes de mais de 30 festivais brasileiros juntamente com a Funarte e o MINC, contando ainda com a presença do colombiano Octavio Arbelaz, diretor do Festival Internacional de Manizales, um dois mais antigos e importantes festivais da América Latina.


O encontro foi um exemplo de como é possível avançar em discussões quando se deixa de lado as reuniões de lamento, tão comuns à cultura quando o tema a ser debatido é políticas públicas. Houve um entendimento geral de que não é função do Estado arcar com toda a atividade cultural mas, sim, criar um terreno fértil e possível para que ela aconteça e se propague. Leonardo Lessa, Diretor do Centro de Artes Cênicas da Funarte, destacou ainda a responsabilidade da Funarte em potencializar a circulação e internacionalização dos produtos artísticos brasileiros e que os festivais são ferramentas de fundamental importância para essa engrenagem, sinalizando que é possível desenvolver algum projeto por esse viés.


Guilherme Varela, Secretário de Políticas Culturais do Ministério da Cultura, reiterou a fala de Lessa ressaltando que é necessário destacar as responsabilidades de cada ente federado; o Estado brasileiro não consegue tomar tudo para si e levar a arte produzida hoje para todos os cantos, isso é impensável sem a articulação com a rede de festivais. Varela lembrou ainda que o pleito é por mudanças estruturais, o que demanda tempo e estratégia, sendo necessário preparar um consistente material numérico para justificar e comprovar perante os outros setores a importância das mudanças solicitadas. Para o Secretário de Políticas Culturais a abordagem deve ser feita por três eixos: financiamento sustentável, regulação tributária e visibilidade e projeção. É preciso entender que festival não é evento (se fosse, a lei Rouanet se aplicaria perfeitamente), uma vez que gera toda uma cadeia de trabalho específica, e que é preciso transformar esses dados em documento para que a mudança possa ser conduzida. É necessário pensar numa forma para além da descentralização de recursos mas, sim, para sua capilarização, e para isso é preciso mudar parte da lógica da Rouanet. Ainda nesse contexto, a atuação junto às instâncias estaduais é fundamental, pois elas, sim, têm a possibilidade de observar e atender as demandas de forma mais aproximada.


Para muitos dos presentes o apontamento foi ainda que, para além de modificar a lógica com o MINC e o poder executivo (diante da relação tributária), é necessário implementar outra lógica com as empresas, que, por muitas vezes, não levam em conta as especificidades dos festivais. Parece consenso também que os festivais não podem se tornar refém dos editais do governo, é necessário recorrer a outras fontes como embaixadas e sobretudo a Educação, que tem uma relação intrínseca a muitos festivais.





Sinalizada por Varela, Carlos Paiva, Secretário de Fomento a Cultura, retomou o assunto da Rouanet declarando que uma mudança estrutural é necessária e está sendo trabalhada para os próximos anos. Para 2016, no entanto, essas mudanças ainda não entrarão em vigor, recebendo a Lei apenas algumas mudanças em seu texto normativo. Paiva compartilhou também outros caminhos e inspirações que vêm conduzindo a reelaboração das políticas de fomento, como é o caso do modelo hoje utilizado na Bahia, no qual os festivais têm sua manutenção aprovada por três edições, o que servirá de inspiração para novas elaborações. Outra preocupação atual da Secretaria é o direcionamento do Fundo que, apesar do baixo orçamento, deve ser redesenhado, dando mais foco para as atividades artísticas. Finalizando, Paiva ressaltou ainda que “O MINC não pode ser uma Secretaria de Cultura do Brasil, ele tem que fomentar os outros entes”, não pode servir apenas para a solução de problemas imediatos e, sim, tem a função de criar condições propícias para o desenvolvimento da cultura nacional.


O intuito dessas reuniões é criar uma força que influencie e cobre a mudança e criação de políticas públicas efetivas para o setor. A construção está em andamento e é necessário que o máximo possível de representantes da área se aproxime. Em conversas com o Ministério fica claro que a pressão civil é fundamental e tem de agir junto ao governo para que ele possa realizar o que o movimento pretende.



Obs.: Participaram do I Encontro de Política de Fomento e Sustentabilidade para Festivais de Teatro:

O idealizador e coordenador do Encontro, o Articulador do Teatro na Política Nacional das Artes (Marcelo Bones); produtora e organizadora do evento a Quitanda das Artes/CE (Paulo Victor Gomes Feitosa); Observatório dos Festivais/MG (Marcelo Bones e Bruna Sobreira); o Festival Internacional de Teatro de Rua de Porto Alegre/RS (Alexandre Vargas); Festival de Teatro Brasileiro/DF (Sérgio Bacelar); Cena Contemporânea/DF (Alaor Rosa); Festival Latino Americano de Teatro da Bahia - FILTE/BA (Luis Alonso); Festival Internacional de Teatro da Bahia/BA (Ricardo Libório); Janeiro de Grandes Espetáculos/PE (Paula de Renor) ; MITsp/SP (Guilherme Marques); Festival de Teatro Lusófono/PI (Francisco Pellé); Festival O Mundo Inteiro é um Palco/RN (Fernando Yamamoto); Festival Latino Americano de Teatro Ruínas Circulares/MG (Yaska Antunes); Festival Internacional de Teatro Belo Horizonte/MG (Cássio Pinheiro); Mostra Internacional de Teatro Paraíba/PB (Luciano Santiago); Festival Internacional de Teatro de Blumenau/SC (Pita Belli); Federação Catarinense de Teatro/SC (Cássio Correia); Festival Viva Dança de Salvador/BA (Cristina Castro); Festival de Música Estranha de São Paulo/SP (Thiago Cury); Festival Maré de Março/BA (Gordo Neto); Cena Brasil Internacional/RJ (Sérgio Saboya); Festival Internacional de Teatro de Campinas/SP (Cynthia Margareth); Mostra de Artes de Rua de Jaguaribe/CE (Ângelo Márcio); Crato Festival/CE (Dane de Jade); Festival Internacional de Artes Cênicas da Bahia, FIAC/BA (Felipe de Assis); Festival dos Inhamuns – Circo, Bonecos e Arte de Rua/CE (Giza Diógenes e Robson Calvante); Festival de Artes Cênicas de Fortaleza/CE (Monique Cardoso); Festival Nacional de Teatro de Rua do Ceará/CE (Nelson Albuquerque e Mario Jorge Maninho); Festival Nordestino de Teatro de Guaramiranga/CE (Nilde Ferreira); Festival Popular de Teatro de Fortaleza/CE (Raimundo Moreira); Festival Internacional de Teatro de Rua de Aracati/CE (Teobaldo Silva); Festival Isnard Azevedo/SC (Luiz Ekke Moukarzel); Articulador da Dança na Política Nacional das Artes – PNA (Rui Moreira); Articuladora das Artes Visuais na Política Nacional das Artes – PNA (Jaqueline Medeiros). E, ainda, os participantes Murilo Albuquerque Custódio; Vanessia Gomes; Alessandro Antonio Silva; Almeida Junior; Frank Alencar; Rildete G. Ribeiro e Maria Rejane Reinaldo


Representantes do poder público: Secretário de Fomento à Cultura do MINC, Carlos Paiva; Secretário de Políticas Culturais do MINC, Guilherme Varela; Diretor do Centro de Artes Cênicas da Funarte, Leonardo Lessa; Coordenadora de Teatro da Funarte, Maria Marighella; Secretário Municipal de Cultura de Florianópolis (SC), Luiz Moukarzer.


Convidado especial: Octavio Arbelaez, diretor do Festival de Teatro de Manizales (Colômbia), Presidente da REDLAT Colômbia e diretor do CIRCULART ‒ Mercado Cultural de Medellín.


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