POR UMA POLÍTICA PÚBLICA PARA OS FESTIVAIS DE TEATRO
POR UMA POLÍTICA PÚBLICA PARA OS FESTIVAIS DE TEATRO Marcelo Bones No Brasil hoje, os festivais de artes cênicas se constituem em um importe acontecimento cultural. Festival Internacional de Artes Cênicas de Pernambuco, Feverestival de Campinas, Festival de Teatro de Curitiba, Festival Maré de Março de Salvador e a Mostra Internacional de Teatro de São Paulo, são apenas alguns exemplos de festivais realizados nos três primeiros meses deste ano. Pela capacidade de mobilizar públicos, produzir pensamento crítico e, inclusive, discutir temas polêmicos, eles nos convocam para uma reflexão mais aprofundada sobre o fenômeno. Estes eventos promovem dimensões artísticas, sociais e políticas desde seu surgimento, que podemos demarcar pela criação de dois emblemáticos festivais ocidentais: o Festival de Avignon, na França, e o Festival de Edimburgo, no Reino Unido. Os dois surgem no mesmo ano de 1947 e com um impulso comum: aglutinar artistas e participar da reconstrução da Europa depois da 2ª Guerra Mundial. Os festivais contribuem, no mundo e em nosso país, decisivamente para a difusão da produção artística, promovendo um importante trabalho de formação de público e plateia, fomentando o intercâmbio nacional e internacional e constituindo se em elo fundamental na cadeia de circulação e fruição da produção das artes cênicas. São espaços privilegiados de inovação e apresentação de vanguardas, investindo na capacitação artística, técnica e de gestão, contribuindo para a divulgação da imagem brasileira no exterior, além de impulsionar mercados de trabalho e economias locais, promovendo significativo impacto econômico na cadeia produtiva da cultura. Um levantamento ainda preliminar, realizado por iniciativa dos próprios realizadores de festivais, mostra que os orçamentos de 25 festivais de teatro entre 2015 e 2016, movimentaram mais de 50 milhões de reais e mobilizaram um público superior a 2 milhões de pessoas. Geraram mais de 15 mil empregos diretos com a circulação de mais de 400 espetáculos nacionais e internacionais. São números que pontuam a robustez dos festivais e apontam para sua relevância, tanto artística quanto econômica. Mesmo com esta reconhecida importância, é gritante a completa ausência histórica de políticas públicas voltadas para os festivais de artes cênicas. Vivenciamos um deserto de formulações e proposições governamentais, com a inexistência de programas consistentes e duradouros que promovam os festivais à suas potencialidades estratégicas. Desde 2004 os festivais de teatro vêm se organizando e buscando provocar o poder público para a necessária e fundamental criação de uma política específica para eles. Atualmente mais de 50, de diversas linguagens e segmentos teatrais, de todas as regiões do país, estão articulados na Rede Brasileira de Festivais de Teatro reivindicando uma ação concreta do poder público na busca de um modelo de financiamento e gestão que se adeque às suas necessidades e aponte para uma estratégia de continuidade e consolidação. Importante também a criação de canais de interlocução com agências públicas e diversos ministérios buscando uma solução geral para os marcos regulatórios alfandegários, trabalhistas, fiscais e tributários e no apoio para a realização de estudos e pesquisas sobre os impactos artísticos e econômicos. Por tudo isto, é fundamental, neste momento, para a sobrevivência dos festivais, a criação de uma política pública específica, construída com a ampliação do diálogo entre as três esferas de governo, a iniciativa privada, meios de comunicação, artistas e sociedade em geral, reforçando a importância estratégica dos festivais para o desenvolvimento artístico e econômico do Brasil. Marcelo Bones é diretor de teatro, coordenador e criador do Observatório dos Festivais (festivais.org.br), foi diretor de duas edições do FIT-BH e é consultor e programador de diversos festivais no Brasil e Portugal.
*Este artigo foi publicado no jorna O Tempo, na coluna Opinião, do dia 08 de abril de 2017